quinta-feira, 28 de novembro de 2013

METEORANGO KID (1970)



“10 anos sem estudar, 10 anos vagabundando por aí,
10 anos de maconha, 10 anos marginal.
Cagar é só o que dá vontade de fazer.
Cagar, porra! Mas é duro.
Só eu pra dizer o trabalho que me deu pra chegar até aqui.”

METEORANGO KID (1970) sugere um trash tupiniquim de heróis. Não é, mas pode causar espanto, risos e repulsa falando de coisas um pouco mais sérias. O movimento underground baiano no final dos anos 60 revelou muita gente interessante. André Luiz Oliveira foi um deles. Formado pela faculdade de cinema da UFBA, André juntou atores do teatro marginal, cinema de vanguarda e Novos Baianos para filmar um texto de sua autoria sobre a revolta da juventude classe média.

No centro de tudo, Lula, um jovem crucificado entre o dever da inconformidade política e a moral da família burguesa. Perdido, opta pela alienação como viés mais simples para levar a vida. Seu poder de ser esculhambado e esculhambar é proporcional. O jovem como interseção dos acontecimentos. Como no clássico de Andréa Tonacci, BLABLABLÁ (1968) todos têm e não têm razão. Os discursos políticos são ora inócuos, ora substanciais. E a idéia é mostrar o que a dúvida pode causar na cabeça daquele jovem, cada vez mais sedento pela repulsa alheia.

Passeia entre as melecas que tira enquanto azara meninas, a indiferença pelos protestos políticos dos amigos e os baseados que queima. Lula delira como se fosse um astro do cinema na pele de heróis como Tarzan e Batman. Ao longo do filme, cruza ainda com outras figuras como o amigo que profere as sábias palavras que abrem esse texto. O filme também nos apresenta um personagem isolado, um inacreditável homem vampiro que tenta, em vão, atacar pescoços de mocinhas indefesas.

Lula, assim como André Luiz Oliveira, observa o mundo com um riso irônico, sede de rebeldia e vontade de mandar todos tomarem… Rebeldes com causa e sem porquês. Isso fica claro na seqüência chave onde Lula e dois amigos enrolam e queimam um baseado. O desfecho é a tradução da ideologia humana. A lei do mais forte. Aliás, depois de METEORANGO, fica fácil saber onde Lírio Ferreira e Selton Mello se inspiraram para a “aula de enrolar baseado” no excelente ARIDO MOVIE (2006).

Esteticamente, METEORANGO KID bebe na fonte de Glauber (principalmente CANCER) e Sganzerla (BANDIDO DA LUZ VERMELHA e HQ), flertando também com o neo-realismo italiano e nouvelle vague. A origem Tropicália e a arte de Helio Oiticica também são facilmente identificadas. No entanto, a ousadia faz o filme parecer muito com os primeiros trabalhos de John Waters, onde a prioridade é apresentar um freak show de figuras repulsivas, aterradoras e surrealistas.

METEORANGO KID entrou para a história como um dos principais filmes marginais do cinema brasileiro e ganhou o prêmio do público no Festival de Brasília. André Luiz Oliveira ainda fez alguns poucos trabalhos, entre eles o genial e premiado LOUCO POR CINEMA (1994) que parece um CECIL B. DEMENTED (John Waters) tupiniquim. O cineasta também realizou recentemente dois filmes que não foram para circuito, são eles EM VERDADE VOS DIGO e SAGRADO SEGREDO, ambos de 2005.
 
 

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